Entrevista - Eddie Van Halen
Entrevista concedida à revista Cover Guitarra em meados de 1998.

Eddie Van Halen - “Estou cansado de virtuosismo!”
O que se pode falar de Eddie Van Halen que todo mundo já não saiba: ele foi o responsável por uma verdadeira revolução no mundo da guitarra. Assim como Hendrix, ele rompeu barreiras, destruiu tradições e estabeleceu um novo conceito na abordagem do instrumento. Depois de inúmeras tentativas frustradas - Eddie nunca estava disponível para fazer entrevistas para o Brasil - a COVER GUITARRA finalmente conseguiu contactá-lo. Com exclusividade, Eddie Van Halen conta um sem número de segredos guitarrísticos para vocês, como ele jamais fez em qualquer outra oportunidade (ao final da entrevista, Eddie fez questão de agradecer, dizendo que tinha sido uma das conversas mais agradáveis que ele já teve com a imprensa). Orgulhosos e contentes, trouxemos a vocês tudo aquilo que conseguimos extrair do Mestre. Divirtam-se!
Você poderia contar aos nossos leitores algumas
peculiaridades sonoras a respeito desse disco, que fossem diferentes de tudo que
você já vez?
Bom, a coisa mais marcante foi o fato de ter feito os vocais principais
em “How Many Say I”, além do que as letras surgiram
antes que as melodias, ao contrário de todos os outros discos.
Eu mesmo participei da elaboração dessas letras, como em
“Without You”, que eu compus no banheiro do estúdio.
Achei o resultado tão legal que mandei instalar lá uma
unidade móvel de gravação, com um gravador Tascam
DA88 e um mixer (risos). Em “Primary ” - que serve de
introdução para “Ballot and the Bullet” - eu
usei uma velha Danelectro Coral Sitar. Na própria
“Ballot...”, usei um dobro com slide, e a miniatura da
Peavey Wolfgang do meu filho para fazer o solo. Em “Once”,
fiz um solo num baixo de seis cordas, e em “Dirty Dog”, uso
apenas um único pedal, que foi um Whammy.
Não pude deixar de notar que os seus solos estão muito
mais concentrados na melodia da canção do que antigamente...
Pois é, os solos deste novo disco estão entre os mais
‘humanos’ que já compus. Não fiquei
preocupado em impressionar ninguém, mas sim em transmitir
emoções reais. Se você e seus leitores escutarem
com atenção, vão notar que eu até chego a
errar em alguns deles. Mas preferi mantê-los, em nome de uma
sinceridade para com o ouvinte. Também pensei que, se revelasse
isso, eu talvez pudesse fazer com que a pessoa ouvisse esse disco
várias vezes, pois só assim as músicas
serão compreendidas na sua essência. Hoje, dou muito mais
valor aos solos feitos com acordes do que aquela loucura toda de
antigamente. Eu nem penso mais em seguir essa linha de virtuosismo.
Estou cansado disso. Quanto menos eu pensar nisso, melhor. O que
costumo dizer é que os solos são como uma trepada: se
você ficar preocupado com o seu desempenho, você
está ferrado! (risos).
Já que estamos falando em solos, aquele que você compôs
para “Beat It”, do Michael Jackson, é considerado um dos momentos mais
brilhantes da sua carreira. Você concorda com isso? Você poderia nos contar um
pouco a respeito dessa gravação?
Sim, eu também acho isso. Me lembro perfeitamente da liberdade
com que Quincy Jones (produtor do referido disco) me deixou no
estúdio, não estabelecendo nenhum tipo de regra ou
orientação sobre o que eu deveria fazer naquela
música. Acabei fazendo esse solo como que um teste e ele acabou
valendo. Só que o técnico de som teve um trabalho imenso
para editar a música em função dele, pois ali a
coisa funcionava com uma base-guia ‘qualquer nota’ e o
vocal do Michael. Todo o restante foi composto pacientemente nos meses
seguintes.
Como surgiu “Eruption”? ‘guitarristicamente’ falando,
ela é, na minha opinião, a mais revolucionária peça musical de todos os
tempos.
Gostei do termo ‘peça musical’ (risos)... Foi a primeira
coisa que compus na afinação em G (Sol) aberto, mas apenas como um exercício de
aquecimento. Uma noite, estávamos no estúdio gravando nosso primeiro disco
quando comecei a tocá-la, de brincadeira. Nosso produtor, Ted Templeman, ficou
tão surpreso com aquilo que exigiu que eu gravasse. O pior é que eu nem sabia
tocar aquilo direito... (incrédulo) Desculpe, mas eu acho que não entendi
direito...
Você disse que não sabia tocar “Eruption” de uma
maneira correta?
(com muita simplicidade) É. Se você e seus leitores
prestarem atenção, há um pequenino erro no finalzinho dela. Se Ted tivesse me
dado mais tempo, eu a teria gravado de uma maneira melhor. Aliás, nosso tempo de
estúdio era tão curto que o primeiro disco foi gravado praticamente ‘ao vivo’ lá
dentro. For Unlawful Carnal Knowledge demorou um ano para ser gravado, enquanto
Balance foi escrito e gravado em quatro meses, principalmente pelo bom trabalho
do produtor Bruce Fairbairn. Aliás, acho que o principal papel do bom produtor é
criar um astral legal no estúdio.
Como funcionava o seu processo de composição naquela
época?
A maioria das músicas dos três primeiros discos surgiram de
idéias que eu tinha na hora de dormir. E das jams que eu fazia com meu irmão.
Depois, levava a espinha dorsal dos arranjos para o restante do grupo. A melhor
maneira de compor é aquela em que você se livra de todos os pré-conceitos com
relação ao formato do que deve ser uma música. Eu nunca consegui sentar no
estúdio e dizer para mim mesmo “agora vou compor uma canção!”. Na única vez em
que fiz isso, compus “Amsterdam” (do disco Balance), música da qual não sinto
muito orgulho.